Nem auxílio emergencial, nem Renda Brasil: Governo promove desmonte na assistência social

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Flaviane da Conceição, de 40 anos, é mãe solteira de três crianças e sustenta a família com o Bolsa Família. Durante a pandemia, ela passou a receber auxílio emergencial, mas não sabe o que fazer quando o benefício acabar, já que o dinheiro não é suficiente para sustentar a alimentação dos filhos. (Photo by Bruna Prado/Getty Images)

A área da assistência social foi uma das mais afetadas durante o governo do presidente Jair Bolsonaro, com expressivos cortes orçamentários e omissão do Ministério da Cidadania, em um momento de crise causada pela covid-19. O cenário econômico, diante da queda no PIB brasileiro e aumento de desemprego, deve aprofundar as desigualdades e a pobreza.

Na última semana, o presidente descartou criar o Renda Brasil, programa estudado pela equipe econômica para substituir o Bolsa Família quando acabar o pagamento do auxílio emergencial aos mais afetados pela pandemia de covid-19.

A União não conseguiu prever fontes de recursos para custear o novo programa sem furar o teto de gastos – emenda à constituição aprovada em 2016 que proibiu o governo de aumentar seus gastos além da inflação.

No entanto, Bolsonaro autorizou o Congresso Nacional a criar um novo programa de assistência social pós-pandemia que deve ser incluído no orçamento de 2021.

Por outro lado, o principal programa social do país, o Bolsa Família, vive um momento de enxugamento. Em 2019, cerca de 500 mil famílias estavam na fila de espera do programa.

RENDA BRASIL
Na avaliação da secretária municipal de Assistência Social de São Luís (MA), Andreia Lauande, essa discussão ilustra a falta de conhecimento do atual governo na área e o descaso com o Sistema Único de Assistência Social (SUAS), composto por vários tipos de serviços.

“A criação do Renda Brasil é um soco no estômago da área social. Você destrói o maior programa de transferência de renda da América Latina, que é o Bolsa Família, tira a equipe técnica da formulação, que acontece fora do SUAS, sem entender as bases do programa e, agora, ainda joga a responsabilidade para o Congresso”, afirma.

Andreia Lauande, que é presidente do Colegiado Nacional de Gestores Municipais de Assistência Social (Congemas), vê um caráter eleitoreiro na criação de um novo programa de transferência de renda e defende melhorias no Bolsa Família.

“O presidente quer um programa para chamar de seu. Mas poderia melhorar o Bolsa Família, porque ainda tem muita gente que precisa de fora. Dizem que zeraram a fila, mas alguns inscritos ainda aguardam para serem inseridos. Além disso, querem tirar recursos dos pobres para dar para os mais pobres”, diz.

Integrantes da equipe econômica do governo afirmaram que havia a possibilidade de congelamento de aposentadorias ou redução em programas como o Benefício de Prestação Continuada (BPC) como forma de viabilizar financeiramente o Renda Brasil.

“O BPC atende idosos e deficientes em situação de vulnerabilidade, com um salário mínimo, que eles gastam basicamente com alimentação e remédios. Tirar ou reduzir esse benefício é sentenciá-los à morte”, argumenta Lauande.

Em paralelo ao estudo do Renda Brasil, a equipe econômica analisava a manutenção do auxílio emergencial.

O pagamento do benefício no valor de R$ 600, por três meses, foi proposto pelo Congresso, e o dinheiro destinado às camadas mais pobres da população aumentou a popularidade de Bolsonaro.

Por isso, o governo pretendia incluir o Renda Brasil no orçamento para 2021, para que o benefício começasse a ser pago em janeiro, quando acaba o pagamento do auxílio emergencial aos afetados pela pandemia.

Entretanto, Andreia Lauande lembra que o auxílio emergencial também não teve a participação dos gestores do Sistema Único de Assistência Social. “O pagamento do benefício foi construído fora do SUAS, não pudemos nem opinar. Mas quando apareceram os problemas, tentaram responsabilizar os municípios e até a alegar que a culpa era do fechamento das unidades do CRAS”, diz ela.

Como exemplo, a gestora cita que, para recorrer ao auxílio emergencial negado, o Ministério da Cidadania encaminhou os interessados para a Defensoria Pública da União, para formalizarem assistência jurídica, em vez de utilizar as unidades de Assistência Social, que poderiam auxiliar às pessoas com informações ou no preenchimento de dados.

“A DPU não tem capilaridade. E os CRAS são referência para a população”, pondera.

“CRIMINALIZAÇÃO DA POBREZA”
O governo federal também tem defendido a revisão e cortes de benefícios irregulares do Bolsa Família e do BPC. Esse discurso, na opinião da presidente do Congemas, acaba por “criminalizar a pobreza”.

Fonte: yahoo